«A próxima música chama-se Casinha, que vou tentar cantar» - Tim, ‘1.º de Agosto no Rock Rendez Vous’ – 1986.
O termo ‘casinha’ é
sobretudo um termo emocional que serve para descrever a relação afetiva com a
nossa própria casa que, no fundo, mais não é do que uma extensão de nós próprios,
é o nosso espaço, é o nosso “cantinho”. Foi esse o caráter emocional que Silva Tavares quis dar quando escreveu
A minha Casinha e que se tornou célebre, pela primeira vez, em 1943
quando foi interpretada por Milú no filme O
Costa do Castelo. Esta música surge, inicialmente,
na banda dos Comendadores do Rock: Tim, Kalú, Zé Pedro, Gui e João Cabeleira porque,
a dada altura, nos ensaios, enquanto o Kalú montava a bateria, os restantes
elementos tocavam o tema na “brincadeira”. Tema esse que, entretanto, se tornou
fundamental nos concertos dos Xutos & Pontapés, porque quando já não havia
mais nada para tocar tocava-se então A minha Casinha. O lançamento da
música (13 de novembro de 1987) em single
também não deixa de ser interessante. Os Xutos vinham com um ano cheio, desde o
lançamento em fevereiro, desse mesmo ano, do seu Circo de Feras onde
estavam os Contentores, que era cantado por todo o País. A banda, nessa
altura, preparava, sem a editora saber, o próximo álbum: 88. Com a ‘explosão’
dos Contentores a editora pretendia lançar esse single no final de 87, para alavancar ainda mais as vendas do Circo
de Feras, no Natal. Os Xutos recusaram, mas também não queriam lançar
nenhum dos temas previstos para o 88, feito em segredo, sugerindo, então,
um tema outsider: A minha Casinha,
ao qual a própria editora, inicialmente, mostrou-se um pouco cética e acabando
apenas por lançar 500 cópias em cassete.
A música foi
crescendo, em uníssono, nos concertos do saudoso Rock Rendez Vous. Algo estava
a nascer, mas nem os Xutos nem as primeiras pessoas que ouviram A Minha Casinha
podiam imaginar que este tema se iria tornar naquilo que é hoje… Tal como
também ninguém imaginava, no domingo passado, que o Éder iria saltar do banco
aos 79 minutos para marcar o golo que viria a dar o Campeonato da Europa a uma Seleção
que, tal como A Minha Casinha, era uma outsider face às principais favoritas.
Como também ninguém
imaginava que, não obstante a grande produção (com um budget à partida
considerável) de um filme, com modelos, filmado em Paris, alterando um brilhante
tema de Pedro Abrunhosa, que este viria a ser substituído por outro tema tão popular.
Corrijo, substituído não, adotado. Adotado por muito mais que onze milhões.
Porque A Minha Casinha, tal como a participação da Seleção Portuguesa
neste Europeu, esteve ligada a grandes e fortes laços emocionais, não adulterados
e, sobretudo, genuínos. Tão genuínos como as lágrimas de Ronaldo. Tão genuíno como
quando este “mandou” Moutinho marcar a grande penalidade. Tão genuíno como
quando Fernando Santos, o Engenheiro das Emoções, afirmou que só voltava dia 11
de julho, e que ia ser recebido em festa com a Taça debaixo do braço. E tão, mas
tão genuíno como os emigrantes acampados em Marcoussis ou em efervescência nos
estádios franceses, efervescência essa que começava aos primeiros acordes d’ A
Minha Casinha. A UEFA tinha confirmado (no primeiro jogo contra a Islândia)
que estava ali o hino que iria simbolizar a campanha de Ronaldo e Companhia, sendo
tocada pela última vez quando se levantou o “Caneco”.
Porque a nossa casinha,
mesmo sem grandes produções, é isto: alegre, modesta, mas que se pode, também,
revelar como surpreendente pela sua ambição. É a marca e a representatividade de
uma Portugalidade atual, universal e multigeracional e que não teme em gritar: «Siiiiiiiiiiiiiimmm».
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